PRO CAUSA DE BEATIFICAÇÃO - PRO CAUSE DE BÉATIFICATION

Amor que comunga

 «Diz a Jesus Escondido,
que eu gosto muito d’Ele
e que O amo muito».
Jacinta

Não devem separar-se na nossa piedade a devoção ao Coração de Jesus e ao Coração de Maria.

Mas na Terra, é na Eucaristia que encontramos vivo o Coração Santíssimo de Jesus, a mostrar-nos aí mais do que em nenhum mistério, quanto tem amado os homens; pois no Santíssimo Sacramento reproduz Cristo, reduzindo-a a uma só, todas as Suas maravilhas de amor: memoriam fecit mirabilium suorum.

Neste Sacramento, portanto, mais do que em nenhum outro ponto, havemos nós de buscar o Coração de Jesus, adorá-Lo, amá-Lo, consagrar-nos a Ele, desagravá-Lo, viver da Sua vida. São inseparáveis as devoções ao Coração de Jesus e à Eucaristia.

Logo, também se não pode desunir, na devoção ao Coração Imaculado de Maria, a devoção a Jesus Sacramentado, tanto mais que «onde está o teu tesoiro, está o teu Coração». O tesoiro de Maria cá na Terra é Jesus Sacramentado; nele pois, mais do que em parte nenhuma se encontra o Seu Coração. Não fosse Ela a Mãe, a Senhora do Santíssimo Sacramento!...

O B. Julião Eymard, Fundador do Instituto dos Sacerdotes Adoradores, ao declinar do século XIX, saudou pri­meiro que ninguém a Maria Santíssima com este titulo inspirado: Nossa Senhora do Santíssimo Sacramento, rogai por nos, jaculatória que logo se difundiu e entrou na série das invocações com que hoje mais frequentemente saudamos a Virgem Maria. Pio X, o Papa da Eucaristia, não hesitou abençoá-la e enriquecê-la de indulgências, por decreto de 30 de Dezembro de 1905.

Ela recorda-nos sinteticamente as relações do Coração de Nossa Senhora com a Eucaristia.

Com todos os mistérios de Jesus tem relação íntima a Sua divina Mãe; onde quer que se apresente Jesus, aí está o Filho de Maria. E Seu Filho no Presépio e é Seu Filho no Templo; é Seu Filho na vida oculta e é Seu Filho na vida pública; é Seu Filho na última ceia, no Horto, na Flagelação, na Coroação de espinhos, na Cruz; é o Seu Filho que nasce, que chora, que prega, que morre. É o Seu Filho que ressuscita e que sobe ao Céu e que triunfa na Glória à dextra do Pai e que há-de vir a julgar os vivos e os mortos.

Por isso, poderíamos, com toda a verdade, invocar Maria com o título de Nossa Senhora do Menino Jesus, Nossa Senhora de Jesus no Templo, Nossa Senhora de Jesus Operário, Nossa Senhora do Divino Mestre, Nossa Senhora de Jesus na Ceia, de Jesus no Horto... de Jesus crucificado; Nossa Senhora de Jesus Ressuscitado, de Jesus subindo ao Céu, de Jesus reinando na Glória...

Por isso também Jesus é Seu Filho, quando consagra o Pão e o Vinho e quando Se deixa ficar escondido debaixo das espécies sacramentais, na Eucaristia. Podemos por­tanto chamá-La: Nossa Senhora de Jesus Escondido e de certo a Jacinta e o Francisco adoptariam logo esta linda jaculatória, que equivale a esta já aprovada: Nossa Senhora do Santíssimo Sacramento.

Àquele Jesus assim oculto pode a Virgem Santíssima ao contemplá-Lo, dizer-Lhe; «Tu és meu Filho»; e pode Jesus com todo o afecto filial de que é capaz o Seu Coração, responder-lhe: «Tu és Minha Mãe»; e nós acompanhando este terno diálogo entre Mãe e Filho, exclamaremos opor­tunamente: «Nossa Senhora do Santíssimo Sacramento, rogai por nós!»

Foi Maria que nos preparou este Pão de Vida; que sublimemente o disse Santo Agostinho! «O Verbo é alimento dos Anjos, mas os homens, apesar de necessitarem d’Ele, não tinham forças para d’Ele se nutrirem. Há porém uma Mãe que come deste Pão, O transforma em leite Seu e O dá aos Seus pobres filhos. E Maria que se nutre do. Verbo e O transforma na Sua humanidade em corpo e sangue; transforma-O nesse leite suavíssimo que se chama a Eucaristia!» [1]

Não temos relíquias de Nossa Senhora, mas temos melhor: possuímos o Santíssimo Sacramento; Aquele Corpo e Aquele Sangue são fruto da substância de Maria.

Não fazemos uma Comunhão que a não devamos a Maria Santíssima; que melhor Relíquia!?

* * *

Compreende-se agora, porque tão em foco nos aparece a Eucaristia desde as primeiras Aparições aos Pas­torinhos da Fátima. Foi para eles profundamente impressionante aquele momento, em que pela terceira vez viram o Anjo. Revela-se-lhes «trazendo na mão um cálice, e sobre ele uma Hóstia da qual caíam dentro do cálice algumas gotas de sangue. Deixando o cálice e a Hóstia suspensos no ar, prostrou-se em terra e repetiu três vezes a oração que já antes referimos: «Santíssima Trindade, Pai, Filho, Espírito Santo, adoro-Vos profundamente e ofereço-Vos o preciosíssimo Corpo, Sangue, Alma e Divindade de Jesus Cristo, presente em todos os sacrários da Terra».

As criancinhas em êxtase, levadas por unia força misteriosa, imitavam o Anjo em tudo repetindo as suas palavras.

Terminada a oração que disse três vezes, levantou-se, tomou o cálice e a Hóstia e dirigindo-se aos pequeninos, deu à Lúcia a Hóstia e ao Francisco e à Jacinta fê-los beber do cálice: «Tomai e bebei o Corpo e o Sangue de Jesus Cristo horrivelmente ultrajado pelos homens ingratos. Reparai os seus crimes e consolai o vosso Deus».

No fim repetiu de novo três vezes a mesma oração e desapareceu.

De forma que esta aparição versou toda expressamente sobre a Comunhão reparadora. Como fruto as três ditosas crianças sentiam-se tão possuídas da presença de Deus, que diz a Lúcia: «nos absorvia e aniquilava quase por completo. Parecia privar-nos do uso dos sentidos. Por vários dias nem mesmo o Francisco se atrevia a falar. Dizia depois: gosto muito de ver o Anjo, mas o pior e que depois não somos capazes de nada. Eu nem andar podia: «não sei o que tinha».

As almas ficaram-lhes a arder em amor a Jesus Sacramentado. Toda a pena dos dois mais pequeninos era não poderem ainda receber a Sagrada Comunhão das mãos do pároco: «Quando um dia passava para a escola — escreve a Lúcia — diz-me a Jacinta: — olha, diz a Jesus escondido, que eu gosto muito d'Ele e que O amo muito».

«Outras vezes dizia: — diz a Jesus que lhe mando muitas saudades».

Quando já muito doentinha, perguntava amargurada: «e vou morrer sem receber a Jesus escondido?! Se mo levasse Nossa Senhora, quando me for buscar para o Céu!...»

E o Francisco? Conta ainda a prima Lúcia: «quando ia à escola, por vezes, ao chegar a Fátima, dizia-me: olha, tu vais a escola; eu fico aqui na igreja junto de Jesus escondido; não me vale a pena aprender a ler, daqui a pouco vou para o Céu. Quando voltares, vem por cá chamar-me».

«O Santíssimo estava então, por causa das obras, à entrada da igreja, do lado esquerdo. O Francisco metia-se entre a pia baptismal e o altar e aí o encontrava, quando voltava. Depois que adoeceu, dizia-me às vezes, quando a caminho da escola passava por sua casa: — Olha, vai à igreja e dá muitas saudades minhas a Jesus escondido. Do que tenho mais pena é de não poder lá ir e estar uns bocados com Jesus escondido...

«Sucedendo levarem as ovelhas a pastar perto da igreja, dizia às companheiras: — Vocês olhem agora pelas ovelhas, enquanto eu vou fazer uma bocadinho de companhia a Jesus escondido. Queria tanto consolá-Lo!...

— Pois sim, vai e não te esqueças dos pecadores! — gritava-lhe a Jacinta. Não tens pena deles?

— Tenho, mas tenho mais pena de Nosso Senhor. Queria primeiro consolá-Lo e depois rezar muito para converter os pecadores.

«Um outro dia ao sair de casa, notei — diz a Lúcia— que o Francisco andava muito de vagar. — Que tens? — lhe perguntei.

— Dói-me muito a cabeça e parece que vou cair.

— Então não venhas, fica em casa.

— Não fico; quero antes ficar na igreja com Jesus escondido, enquanto que tu vais à escola».

Aí está, como aqueles privilegiados filhinhos do Coração Imaculado de Maria, são não só fervorosos amantes desse Coração maternal, mas almas apaixonadamente eucarísticas. Não seria trabalho perfeito em suas almas, se o Imaculado Coração de Maria os não levasse a este amor de Jesus escondido. Como não seriam trabalho perfeito todas as maravilhas da Fátima, se elas de um modo especial, directa ou indirectamente, não conduzissem as almas a Jesus Sacramentado.

Mas Fátima, logo depois que a Autoridade eclesiástica se manifestou, bem depressa começou a dar esta prova real de si. Onde é que em Portugal e dizemos até, no mundo, se comunga com tanta devoção e em tão grandes multidões, como em Fátima? Os dias 13 de Maio de cada ano são grandiosas apoteoses de Jesus Sacramentado, que lembram os grandes Congressos Eucarísticos Internacionais Copiemos ao acaso da «Voz de Fátima» no número de Junho de 1947, referindo-se ao 13 de Maio; «A Adoração Eucarística: Jesus-Hóstia é solenemente exposto no altar exterior armado em frente do portão principal da igreja em construção. Durante as primeiras duas horas de adoração, o Snr. Bispo de Gurza preside à reza do Terço, comentando os mistérios dolorosos do Rosário, nos intervalos das dezenas... A cerimónia tão tocante de adoração nocturna prolongou-se por toda a noite, Conservando-se a multidão piedosa até ao fim, não obstante a noite ser tão agreste.

As horas de adoração ao Santíssimo Sacramento solenemente exposto — horas intensas de prece e de penitência.... encerradas com a bênção eucarística, seguiram-se as Missas em dezenas de altares do Santuário A Comunhão geral distribuída por trinta e cinco Sacerdotes, aproximaram-se da Sagrada Mesa para receber o Pão dos Anjos, muitos milhares de fiéis de ambos os sexos e de todas as idades e condições sociais. Também foi distribuída a Comunhão a muitos doentes hospitalizados Durante o acto eram entoados ao microfone hinos eucarísticos que todo o povo acompanhava com devoção e entusiasmo. O número de Comunhões elevou-se a trinta e cinco mil!»

A mais estupenda manifestação porém, teve lugar um ano antes, no inolvidável dia da Coroação de Nossa Senhora pelo Legado Pontifício, a 13 de Maio. «Cinquenta Sacerdotes revestidos de sobrepeliz e estola — escreve a «Voz da Fátima» de Junho desse ano espalharam-se pelo recinto, a distribuir Conjuntamente com Sua Eminência, o Pão dos Anjos.

Nos diversos altares do Santuário celebraram desde as duas horas da madrugada muitas centenas de Sacer­dotes. Foram distribuídas para cima de 130.000 Partículas Consagradas a mais numerosa comunhão geral que jamais houve em Terra de Santa Maria».     

Estes os resultados magníficos conseguidos pela Medianeira de todas as graças, Nossa Senhora do Santíssimo Sacramento, a Rainha de Fátima, o Coração Imaculado de Maria. E esta a Sua glória, não somente arrancar as almas do pecado, mas trazê-las aos milhares, às centenas de, milhares, aos milhões a Jesus Sacramentado, para me­lhor e mais eficazmente lhes garantir a vida eterna. Por­que Jesus Sacramentado é o Pão que desceu do Céu e quem come deste Pão tem a vida eterna e Jesus ressus­citá-lo-á no último dia.

* * *

Nas Suas revelações, Maria Santíssima indica, como prática essencial à devoção ao Seu Imaculado Coração, a Comunhão reparadora, no primeiro sábado de cada mês, durante cinco meses seguidos. Oiçamos as palavras dirigidas à Irmã Lúcia: «diz que prometo assistir na hora da morte, com as graças necessárias para a salvação, a todos os que no primeiro sábado de cinco meses seguidos, se confessarem, receberem a Sagrada Comunhão, rezarem um Terço e Me fizerem companhia, meditando nos quinze mistérios do Rosário, com o fim de Me desagravarem».

Marca Nossa Senhora para essa Comunhão o sábado, como quem diz: o Seu dia. O dia do Senhor é o domingo; o dia da Senhora é o sábado, dia que na liturgia goza de Missa e Ofício próprios em honra de Maria Santíssima, a celebrar-se sempre que outra festa de rito mais elevado o não impede. Quer muito a este Seu dia, Nossa Senhora; por isso, a ele liga tantas graças extraordinárias, como por exemplo, o privilégio sabatino do escapulário do Carmo e agora este.

O primeiro sábado começou a ser celebrado com especiais actos de piedade em honra de Nossa Senhora, por uma analogia com a primeira sexta-feira em honra do Sagrado Coração de Jesus. Já o P. Picot de La Clorivière, S.J., durante a revolução francesa lançou a primeira semente desta ideia; mas posteriormente algumas almas piedosas, à semelhança do que se faz ao Coração de Jesus na primeira sexta-feira, principiaram a celebrar também o primeiro sábado, para desagravar o Imaculado Coração de Maria das ofensas que Lhe são feitas. Este desejo foi manifestado em Roma a Pio X o qual por decreto de 13 de Junho de 1912, [2] aprovava e favorecia a piedosa devoção.

A finalidade era intensificar nos fiéis a devoção a Maria Santíssima e fomentar o desejo de reparar as ofensas que Lhe são feitas, sobretudo as blasfémias. Três coisas se deveriam cumprir: a Comunhão dos primeiros sábados; algum acto de piedade, não expresso no decreto; e fazer tudo ema espírito de reparação para com a Santíssima Virgem.

Tanto Lhe agradou esta prática, que em Fátima vem Nossa Senhora sancioná-la também e enriquecê-la de tão estupenda promessa; e dignou-se determinar por Si mesma os actos de piedade que além da Comunhão desejava, que praticássemos: um terço e quinze minutos a fazer-lhe com­panhia, meditando nos mistérios do Rosário, para A desagravarmos.

A quem, ao menos durante cinco sábados seguidos, no primeiro de cada mês Lhe prestar estes obséquios, pro­mete assistir na hora da morte com as graças necessárias à salvação.

O decreto de Pio X concede indulgência plenária para o primeiro sábado, assim celebrado e postas as condições do costume.

Resumindo: não é verdadeira nem sólida a devoção ao Imaculado Coração de Maria, se nos não levar a uma devoção a Jesus Sacramentado, manifestada particularmente na Comunhão frequente. Quem neste ponto quiser dar gosto A Senhora do Santíssimo Sacramento, faça ao menos a Comunhão reparadora no primeiro sábado de cinco meses seguidos, tendo-se preparado para ela com uma boa confissão, reze nesse dia o Terço, não de fugida, mas meditando durante um quarto de hora nos mistérios do Rosário e o Coração Imaculado de Maria lhe alcançará a salvação.


[1] In Ps. XXXIII.

[2] AAS IV, 623. a 30 de Setembro.