Espírito
próprio desta devoção, o amor
«Se eu pudesse
meter no coração de toda a gente
o lume que tenho cá dentro do peito!»
Jacinta
Muitas
práticas de devoção ao Coração de Maria se poderiam escogitar e sugerir, como
por exemplo, a veneração e
propaganda de Suas imagens e medalhas, e neste caso,
parece impõr-se essa Milagrosa Medalhinha,
revelada pela Virgem a Santa Catarina Labouré, que de um lado Leva explícito com
o de Jesus o Coração de Maria; o uso do escapulário do Coração de Maria o do
escapulário verde; o oficio do Coração de Nossa Senhora e as Suas Ladainhas; a
celebração do mês do Coração de Maria em Agosto ou pelo menos a da Sua festa
nesse mesmo mês, a 22; inscrever-se nalguma Confraria ou Pia União do Coração
de Maria.
Mas preferimos cingir-nos ao que mais expressamente é inculcado por
Nossa Senhora aos Videntes de Fátima.
Antes porém releva
considerar o que naturalmente deve caracterizar esta devoção, em todas as suas
práticas, ou seja, o espírito que a anima. Este incontestavelmente é da nossa
parte o amor fina1 para com tão Boa Mãe.
Eis a nota que a
Santíssima Virgem vem pôr em vibração no coração dos homens, ao revelar-lhes o
Seu próprio Coração, todo amor e misericórdia: despertar neles o amor de filhos
para com Ela. Boa garantia portanto, de resultados magníficos.
Na verdade, quem
resiste a um coração de mãe? O Amor filial é a última reserva, a extinguir-se no
peito humano. Mesmo quando tudo se queimou ou arruinou, lá remanesce sob as
cinzas ou debaixo dos escombros esta centelha sagrada, derradeira esperança de
ressurreição para mortos e ponto de partida para nova vida.
O Coração
Imaculado de Maria aparece-nos com todo o Seu amor de Mãe, amor heróico e
inesgotável, pondo em jogo toda a ternura, bondade e compaixão do Seu afecto;
cativando-nos com a Sua beleza sem par, subjugando-nos suave, mas fortemente,
com toda a majestade da Sua grandeza de Mãe de Deus e de Rainha do Universo.
Os resultados para
logo se tornam patentes. Nas almas limpas e bem dispostas ateiam-se incêndios
que rapidamente as transformam e elevam a grande santidade, como vemos até em
criancinhas da idade da Jacinta e do Francisco. Aos pecadores com a maior
facilidade os arranca do pecado, para darem começo a unia vida digna de
cristãos.
Quem leu a vida da
Jacinta e do Francisco concordara facilmente com estas asserções, no que
respeita em primeiro lugar, ao amor despertado pelo Coração de Maria nessas
alminhas inocentes. Amor que as avassala e cativa deliciosamente,
definitivamente.
—
«Ai que
Senhora tão bonita!», era o estribilho incessante da exuberante Jacinta, logo
após a primeira aparição.
—
Gosto
tanto de Nosso Senhor e de Nossa Senhora, que me não canso de Lhes dizer que
os amo... Quando lho digo muitas vezes, parece que tenho lume no
peito, mas não me queima...» — declarava ainda a pequenina.
E ao receber um a
estampa do Coração de Jesus, que lhe presenteava a prima: — «Beijo-O no Coração,
que é o de que mais gosto; — exclama — quem me dera também um Coração de Maria!
Não tens nenhum? Gosto de ter os dois juntos!»
E os ardores deste
afecto tanto se intensificam, que por vezes desafogava em termos como estes: —
«Se eu pudesse meter no coração de toda a gente o lume que tenho cá dentro do
peito a queimar-me e a fazer-me gostar tanto do Coração de Jesus e do Coração de
Maria!?»
Tanto amor,
ultrapassando já as raias da graça ordinária, começou a informar desde a
primeira aparição todo o viver dos Pastorinhos privilegiados. Depressa os
desprendeu totalmente de si mesmos, de seus interesses e caprichos, e já não têm
outros interesses, outros pensamentos, outras preocupações senão os de Maria
Santíssima, Sua Boa Mãe.
Ela vem para
salvar os pecadores; para tanto, pede oração, sacrifício, desagravo. Os
pequeninos transformam a sua vida numa contínua oração, num ininterrupto
sacrifício; ficam-se longas horas prostrados por terra a orar, a repetir as
orações que lhes ensinara o Anjo e Maria Santíssima. Outras vezes não rezam:
meditam, contemplam o inferno e a sorte tremenda dos pobres pecadores que morrem
em pecado mortal; sentem pena deles; sentem pena de Nossa Senhora e de Nosso
Senhor; querem consolá-Los por todos os modos.
— «Francisco, tu
sofres muito? — perguntavam-lhe:
— Sim sofro; mas
sofro tudo por amor de Nosso Senhor. Queria sofrer mais, mas não posso»
— assim respondia o zagal na última doença.
— «Cada vez me
custa mais a tomar o leite e os caldos – significava também, já muito doentinha,
a Jacinta à sua prima Lúcia — Mas não digo nada; tomo tudo por amor de Nosso
Senhor e do Imaculado Coração de Maria, nossa Mãezinha do Céu».
E já mal podendo
erguer-se do leito, lá se levantava, prostrava-se por terra, beijava o chão e
dizia: «Meu Deus, eu creio, adoro, espero e amo-Vos e peço-Vos perdão para os
que não crêem, não adoram, não esperam e Vos não amam».
Aí está o
resultado imediato e prodigioso obtido por Maria Santíssima ao revelar o Seu
Coração amantíssimo a estes Seus filhos inocentes. Pondo-lhes assim os
coraçõezinhos em chamas, pode a Senhora agora pedir deles o que quiser: orações,
Terços, sacrifícios, martírios, a vida; será pronta e generosamente atendida,
porque toda a ânsia de quem deveras ama é dar-se o mais possível à pessoa amada,
ainda à custa das maiores imolações.
Este amor ardente
e incondicional encontramo-lo invariavelmente em todos os grandes devotos de
Nossa Senhora e nos que melhor conheceram e compreenderam o Seu Coração
Imaculado.
* * *
E com os
pecadores?
«Maria garantiu a Santa Brígida que é Mãe
não só dos justos e inocentes, mas também dos pecadores que se querem emendar.
Se, desejoso de emenda, recorre um pecador a esta Mãe de Misericórdia, oh, como
A encontra pronta para o abraçar e socorrer, ainda mais do que se fosse sua mãe
corporal. Era justamente o que o Papa Gregório VII escrevia à princesa Matilde:
— desiste da vontade de pecar e acharás Maria, eu o garanto, mais pronta a
amar-te, do que tua própria mãe».
Mas diremos mais:
o Imaculado Coração de Maria é quem primeiro vem ao encontro do pecador, ainda
antes que ele pense em converter-se e desistir do pecado; aproxima-se dele,
faz-lhe sentir que ainda é sua Mãe e apesar dos pecados que o mancham, desperta
a Virgem no coração do pobre infeliz um primeiro afecto filial de
correspondência a este amor materno, cujo resultado imediato é banharem-se-lhe
de lágrimas os olhos e tratar logo de se libertar dos pecados.
«Poderá este amor exercer-se nas suas
primeiras manifestações, dentro da esfera da simples sentimentalidade humana;
não deixará porém de pertencer à ordem das afeições puras... Assim, o exercício
de amor infundirá coragem, e esperança na alma afastada de Deus».
Não o comprovam
superabundantemente os factos desde que Nossa Senhora apareceu em Fátima?
Quantos milhares de pecadores se têm sentido abalar profundamente, ao
penetrar-lhes lá dentro na alma «a queixa amorosa e terno pedido»; «Não ofendam
mais a Nosso Senhor que já está muito ofendido!»
São estes os
maiores milagres de Fátima, de Lourdes e de La Salette e de Nossa Senhora das
Graças. Bem se vê que Ela é Rainha e Senhora dos Corações e dispõe para os mover
e transformar de todo o poder de Mãe de Deus e de Mãe dos homens; de todos os
tesoiros das graças divinas.
«Ninguém resiste à atracção deste Íman
dos Corações — escreveu Aguilar — «Ninguém duvida que a força atractiva da
mulher está no coração... E o que nas outras costuma apartar de Deus, em Maria,
pela Sua virginal pureza, aproxima do mesmo Deus. Além disso atrai-nos com amor
de Mãe e todo o encanto da mãe reside no coração. Finalmente por ser amor de Mãe
divina, transforma o nosso amor e leva-nos a Deus».
O que importa,
pois, é que de algum modo se estabeleça o contacto entre o pecador e o
misericordioso Coração de Maria. Bem hajam os que todos os dias rezam pelo menos
três Ave-marias a Nossa Senhora; a seus tempos se verão os efeitos portentosos
de tão fácil prática. Bem hajam os que trazem consigo e fazem trazer os outros a
Medalha milagrosa, o escapulário do Carmo ou qualquer outro escapulário: esta
demonstração de piedade é já poderoso contacto, para que um dia se sinta a
prodigiosa acção de Maria.
Bem hajam
particularmente os que deliberaram levar em peregrinação pela Europa, pela
América e pelo mundo a imagem de Nossa Senhora de Fátima! Que rasto luminoso de
maravilhas, que esteira deslumbrante de graças vai deixando em pós de Si, à
medida que avança pela Terra toda de que é Rainha! Os monumentos mais
indeléveis e gloriosos dessa Sua passagem são os que se erguem nas almas de
tantos pecadores convertidos, que ainda hoje haveriam de jazer no pecador se a
Senhora não passasse junto deles e lhes não trespassasse a alma com o Seu amor!
Quantas pessoas
piedosas chamadas a maior fervor e santidade só porque este Coração de Mãe ao
passar ou ser vista, as feriu de amor! Agora nada lhes custa, levadas desse
amor, cumprir generosamente o que o Coração de Maria lhes pede: oração, Terço
diário, comunhão em desagravo ao Imaculado Coração de Maria, nos cinco primeiros
sábados, Consagração ao Seu Coração, sacrifício pelos pecadores.
* * *
Como se vê, se bem
se repara, o Coração Imaculado de Maria na Sua mensagem e acção, segue os
trâmites do Sagrado Coração de Jesus. Se Eles são inseparáveis, estes dois
Santíssimos Corações!... Se Eles são um só Coração!...
Jesus, ao revelar-se em Paray a Santa
Margarida Maria, declarava que vinha numa ânsia de ser amado dos homens;
por isso dera nesta invenção de lhes manifestar o Seu Coração. E
«reinará apesar dos Seus inimigos e tornar-se-á o Senhor e possuidor dos nossos
corações — como escreve a Santa — pois é o fim principal desta devoção:
converter os homens ao Seu amor».
Essa devoção apresenta-se como uma redenção amorosa, para nos colocar na
suave liberdade e império do Seu amor, o qual deseja estabelecer-se no coração
de todos os que a queiram abraçar, como explica Santa Margarida Maria.
Pois bem: é para
isto mesmo que vem Nossa Senhora dar-nos nesta hora mais expressamente e mais
deveras o Seu Imaculado Coração: é para promover mais intensamente, mais
universalmente este reinado de amor de Seu Divino Filho; para manifestar e fazer
experimentar ao mundo, ainda mais profusamente do que até aqui, essa como
nova Redenção de amor. Com o Seu Coração Imaculado a transbordar de
misericórdia e amor fraterno meteu-se Ela agora a Missionária do mundo todo,
mais do que em nenhuma época da História.
«Vers l’Avenir» de Namur escrevia que
estamos a assistir no mundo a um movimento de piedade, como não se via desde os
séculos XII e XIII... Paulo Claudel referindo-se precisamente aos acontecimentos
maravilhosos da Fátima, assim se expressou: «vale a pena ter vivido só para ver
isto!» Desde que o mundo é mundo nunca se conheceu movimento mais universal do
que este da devoção a Nossa Senhora de Fátima... Quase de um momento para o
outro, Nossa Senhora de Fátima conquista por Si mesma o universo inteiro, do
gelo dos poios, aos desertos africanos, das metrópoles americanas, as Ilhas mais
perdidas do Pacifico.
Todo o empenho do
Coração de Maria nesta sua missão mundial é, primeiro que tudo, que deixem de
ofender esse Amor de Jesus «que já está muito ofendido», tanto, que Ela
já quase não pode suster o braço da justiça divina e, por isso, pede aos Seus
filhos pecadores, «não ofendam mais a Nosso Senhor». E eles, sentindo despertar
em si o afecto filial a tão boa Mãe, comovem-se, choram os seus pecados e
voltam-se arrependidos para o Senhor.
Na medida pois, em
que as almas se deixem prender e dominar do amor ao Coração de Maria, nessa
medida se aproximam do amor ao Coração Santíssimo de Jesus; e logo que esta Mãe
benditíssima se tiver apoderado de todos os corações, como Sua Rainha e Mãe,
terá chegado o grande momento triunfal do Reinado do Coração Divino de Jesus na
Terra.
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