PRO CAUSA DE BEATIFICAÇÃO - PRO CAUSE DE BÉATIFICATION

Coração de Rainha, Rainha dos Corações

«Por fim, Meu Coração triunfará!»
Nossa Senhora à Lúcia

Nossa Senhora nas Suas Aparições em Fátima, desce à Terra a tratar de assuntos que abrangem o mundo todo, no presente e no futuro; apresenta-se como quem tem poder para isso; fala com autoridade própria.

Depois de declarar, que é a Senhora do Rosário, afirma também, que ao mundo prevaricador e portanto merecedor dos maiores castigos, «Só Ela lhe pode valer». Determina o que se deve pôr em prática, se se quer perdão e paz para a Terra e profetiza, que apesar de tudo, «por fim o Seu Coração triunfará». Promete, como quem as pode dar, as graças de salvação, aos que fizerem o que Ela diz.

Numa palavra: Nossa Senhora apresenta-se em Fátima, como quem é: Rainha do Universo. Afinal a Sua mediação Universal de que já falámos, não é mais do que o exercício dessa realeza; e a Consagração de todo o mundo que por Pio XII Lhe foi feita, reconhece esta ver­dade de que Maria é Rainha e Senhora do Mundo.

Sua Santidade Pio XII, nessa Consagração ao Imaculado Coração de Maria, declara expressamente: «Como ao Coração do Vosso Jesus foram consagrados a Igreja e o género humano, para que colocando nele todas as suas esperanças, lhes fosse sinal e penhor de vitória e salvação, assim desde hoje Vos sejam perpetuamente consagra dos também a Vós e ao Vosso Coração Imaculado, ó Mãe nossa e Rainha do Mundo

Mais declaradamente porém, temos a proclamação formal da realeza universal de Maria Santíssima, na segunda Mensagem dirigida a Fátima, ao ser coroada a Santa Imagem pelo Legado Pontifício, Card. Bento Aloisi Masella, a 13 de Maio de 1946.

Referindo-se o Papa á riquíssima coroa ofertada pelos Portugueses a Nossa Senhora diz assim: «Coroa preciosa, símbolo expressivo de amor e gratidão. O vosso mesmo concurso imenso, o fervor das vossas preces, o troar das vossas aclamações, todo o santo entusiasmo que em vós vibra incoercível e depois o sagrado rito que se acaba de realizar, nesta hora incomparável de triunfo da Mãe Santíssima, evocam ao Nosso espírito outras multidões bem mais divinas, outra hora — eternamente solene — no dia sem ocaso da eternidade, quando a Virgem Gloriosa, entrando triunfante na Pátria celeste, foi através das jerarquias bem-aventuradas e dos Coros angélicos, sublimada até ao trono da Trindade Beatíssima, que cingindo-Lhe a fronte de uni tríplice diadema de glória, A apresentou à Corte celeste, assentada à direita do Rei imortal dos séculos e coroada Rainha do Universo».

Esta mensagem de Pio XII vem ao encontro dos votos da Cristandade, tantas vezes dirigidos à Santa Sé, a pedir a proclamação de Maria como Rainha Universal.

Quando chegaram a Pio IX inúmeros pedidos para a Consagração do mundo a Nossa Senhora, acolheu com todo o carinho esse postulado e acrescentou: «na verdade falta ainda alguma coisa à realeza de Maria, enquanto os seus súbditos A não proclamarem voluntária e solenemente; pedi, pois, muito para este belo pensamento amadureça a fim de que a Igreja possa outorgar à Virgem esta nova glória».

Desde as Aparições de Nossa Senhora a Santa Catarina Labouré em 1830[1], se principiou a solicitar do Papa juntamente com a Consagração, a declaração solene da realeza universal de Maria e em 1875 foi aprovado o título de Virgem Imaculada, Rainha do Universo, para a estátua do Santuário no Monte Pio IX, erecta no cimo dos Alpes. Na mesma ocasião se fundava uma associação com o fim de propagar o culto da realeza universal da Mãe de Deus.

Nem é mister advertir, que chamar Maria Rainha do Universo, não era dar-Lhe um título novo; é confirmar o que o mesmo Deus estabeleceu e o que a Igreja não cessa de afirmar pela boca dos seus doutores e do Seu Chefe infalível. E anunciar o que a razão esclarecida pela fé sempre viu claro e o que os corações informados pela caridade divina sentiram sempre.

Sua Santidade na referida Mensagem lembra as razões teológicas com que se demonstra esta realeza de Maria:

Primeiramente, a Virgem é Rainha do Universo «porque mais cheia de graça, mais santa, mais formosa, mais endeusada incomparavelmente mais que os maiores Santos e Anjos, ou separados ou juntos».

Quer dizer: ainda que outras razões não houvesse Maria tinha direito ao título de Rainha, porque a todos sobrepuja em graça, santidade, beleza e divinização. Assim, Ela é Rainha dos Anjos — escreve Campana — porque embora de natureza humana, possui pureza e graça superior à deles. E Rainha dos Patriarcas, porque é por Maria que receberam o objecto dos seus desejos. Foi o Fruto do seu castíssimo seio que ouviu os suspiros dos Patriarcas e os libertou do lugar de trevas onde esperavam a glória e a felicidade. E a Rainha dos Profetas, porque Ela mesma foi Profetiza e deu ao mundo a realidade prometida: de Sua carne e de Seu sangue formou o Messias, cujo perfil os Profetas inspirados por Deus tinham ante­riormente esboçado em seus oráculos. E Rainha dos Apóstolos, porque pelas Suas orações receberam eles com o Espírito Santo, o dom da palavra e também porque amorosa e eficazmente lhes assistiu na obra da conversão das almas. E Rainha dos Mártires, porque associada aos sofrimentos de Seu Filho, padeceu no Seu Coração de Mãe mais que todos os heróis da Fé em seus corpos. E Rainha dos Confessores, porque Sua vida é o modelo sublime de todas as virtudes que os Confessores praticaram e com as quais mereceram a glória eterna. E Rainha das Virgens, porque as sobreleva a todas no candor virginal e reúne em Si as duas auréolas da virgindade e da maternidade».[2]

Pio XII, depois de indicar este argumento de antonomásia, dá uma segunda razão mais poderosa, pela qual a Virgem merece este diadema de Rainha, «porque mis­teriosamente emparentada, na ordem da união hipostática, com toda a Trindade Beatíssima, com Aquele que só e por essência a Majestade Infinita, Rei dos Reis e Senhor dos senhores, qual Filha primogénita do Padre e Mãe estremosa do Verbo e Esposa predilecta do Espírito Santo».

Já estudamos todos estes títulos, por isso fácil nos é agora compreendermos a força deste argumento. - Pela união que existe entre Maria e as Três Pessoas da San­tíssima Trindade, está colocada incomensuravelmente aci­ma de todas as jerarquias angélicas; domina-as a todas; todas Lhe estão submetidas.

A estas razões acrescenta Sua Santidade Pio XII outra já incluída na antecedente, ou melhor, é a razão da antecedente: Maria é Rainha «porque Mãe do Rei divino, daquele a quem desde o seio materno deu o Senhor Deus o trono de David e a realeza eterna da casa de Jacob[3] e que de Si mesmo proclamou ter-Lhe sido dado todo o po­der nos Céus e na Terra;[4] Ele, o Filho de Deus reflecte sobre a celeste Mãe a glória, a majestade, o império da Sua realeza.»

A Mãe do Rei é Rainha; a Esposa do Rei é Rainha. Maria como Mãe de Cristo que é o Criador, é Rainha de toda a Criação e por isso também Rainha dos Anjos, que não só dos homens; Maria, Mãe de Jesus que mesmo como homem é Rei Universal, participa também dessa realeza do Filho.

Mais ainda, como ensina o Papa, é Rainha: «porque associada como Mãe e Ministra ao Rei dos Mártires na obra inefável da humana Redenção, Lhe é para sempre associada com um poder quase imenso, na distribuição das graças que da Redenção derivam». Nestas palavras incluem-se duas razões da realeza de Maria: a primeira é esta: assim como Cristo, além de outros títulos, é Rei porque nos conquistou, remindo-nos com Sua Paixão e morte; assim Maria é Rainha, porque também Ela com Suas dores junto da Cruz nos conquistou como Corredentora. Segunda razão: em consequência, de facto e de di­reito, exerce esse poder de Rainha distribuindo-nos «as graças que da Redenção derivam».

Terrien resumindo neste ponto a doutrina de Suarez[5], diz que Maria é nossa Rainha «porque seguiu ao nosso Salvador no Calvário; concorreu livre e voluntariamente para a Redenção do mundo, oferecendo por nós Seu Filho; associou-se com a Sua Compaixão à Paixão de Jesus Crucificado. Dela também se pode dizer com toda a verdade: Regnavit a ligno: conquistou o Seu reino pela Cruz».[6] Como por outro lado tudo o que é obra da aplicação da graça às almas, se atribui ao Espírito Santo, eis que Maria, Esposa do Espírito Santo, é a Sua grande Cooperadora na distribuição das graças: novo título pelo qual Ela é Rainha.

«Por isso — continua o Sumo Pontífice — a Igreja A saúda Senhora e Rainha dos Anjos e dos Santos, dos Pa­triarcas e dos Profetas, dos Apóstolos e dos Mártires, dos Confessores e das Virgens; por isso A aclama Rainha dos Céus e da Terra, gloriosa Rainha do Universo[7]; e nos ensina A invocá-La de dia e de noite, entre os gemidos e lágrimas de que é fecundo este exílio: Salve Rainha, Mãe de Misericórdia, Vida, Doçura, Esperança Nossa».

Nem foi outro o modo de falar dos Santos Padres e dos Teólogos, como Santo Agostinho que dizia: «baste ao espírito humano saber que a Virgem é Rainha dos Céus, porque é Mãe do Rei dos Anjos»;[8] do mesmo modo Santo Anselmo, Santo Ildefonso, S. Boaventura, S. João Damas­ceno, S. Bernardino de Sena: «quantas são as criaturas que servem à Trindade — pregava este Santo — tantas são as que obedecem a Maria, qualquer que seja a sua dignidade, já pertençam às puramente espirituais, como os Anjos, já às misturadas de corpo e espírito, como os ho­mens, já às meramente corporais, como os Céus e os ele­mentos; tudo está sujeito ao império da Gloriosa Virgem, tanto no Céu, como na Terra, como no inferno».[9]

Para não alongar este capítulo, não nos demoremos, em verdade tão clara, com mais citações.

 

* * *

 

Sua Santidade depois das razões aduzidas, declara-nos a feição peculiar desta Prerrogativa de Maria: «A Sua realeza é essencialmente materna, exclusivamente benéfica».

E por ser Mãe que Ela é Rainha; para melhor poder exercer a Sua Missão de Mãe, dispõe de todo o Seu poder de Rainha. Por isso Santa Teresinha do Menino Jesus dizia que Nossa Senhora era mais Mãe do que Rainha.

E o Seu Coração de Mãe que lhe dita o manejo desse poder real; não admira portanto, que só o use, como afir­ma o Papa, para beneficiar a Seus filhos e que seja preci­samente por experimentarem os Seus benefícios de Mãe, que os homens e as nações conhecem palpavelmente o Seu poder de Rainha.

«Não é precisamente esta realeza que vós tendes experimentado? interrogava o Sumo Pontífice, à Nação Portuguesa, na Mensagem da coroação de Nossa Senhora de Fátima, que vamos seguindo — «Não são os infindos benefícios, os carinhos inumeráveis com que vos tem mimoseado o Coração materno da Augusta Rainha, que vós hoje aqui (em Fátima) proclamais e agradeceis?»

E o que o Papa diz de Portugal há-de se em proporção dizer do Brasil e de tantas Nações católicas que atra­vés da sua história têm aclamado Maria Santíssima como sua Rainha e Padroeira.

Que faz a Polónia no seu afecto a «Grande Senhora» de Cracóvia[10], a Bélgica a Nossa Senhora de Hal, a França a Nossa Senhora de Lourdes[11], a Itália a Nossa Senhora da «Ara Coeli», a Espanha a Nossa Senhora do Pilar, o México[12] a Nossa Senhora de Guadalupe e o Brasil a Nossa Senhora da Conceição da Aparecida?[13] Todos à uma proclamam a Virgem Maria como sua Rainha, por tão continuamente terem experimentado, em auxílios prodigiosos, o Seu amor de Mãe.

Particularmente se mostra a Virgem maravilhosa ao pôr em jogo todo o Seu poder de Rainha para conquistar, render e transformar os corações, mesmo os mais rebeldes e endurecidos no pecado. Só assim se explicam as inúmeras conversões obtidas, por exemplo, por meio da Medalha Milagrosa. Só assim se explica, que ao passar na Sua peregrinação através de várias nações da Europa, do Canadá e Estados Unidos, a Senhora de Fátima, pessoas que já se não confessavam há trinta anos, caiam de joelhos em plena rua, ao verem a Imagem e comecem a bra­dar, que se querem converter, que se querem confessar.

E que o Coração de Maria usa do Seu poder de Rainha, mais que tudo para conquistar corações: por isso A aclamam por antonomásia a Rainha dos Corações. E não há terreno onde Ela mais deseje reinar do que nos corações, no íntimo de nossas almas; aí sim, que Ela exerce as Suas funções de Mãe gerando-nos em Cristo, ou gerando Cristo em nós, conformando-nos em tudo ao Seu Primogénito. Primeiro limpa-nos do pecado e das faltas deliberadas; depois vai implantando cá dentro todas as virtudes e não descansa enquanto nos não transforma no Seu amor e nos faz, à Sua imitação, viver só de amor.

Então chegou o momento suspirado do pleno triunfo do Seu Coração de Mãe e de


[1] Santa Catarina Labouré ao relatar a aparição em que Nossa Senhora lhe explicou: — Este globo que vês representa o mundo in­teiro e especialmente a França e cada pessoa em particular — acres­centa oh, que belo será ouvir dizer Maria é Rainha do Universo! As crianças A aclamarão Rainha e Senhora de todo o mundo e cada pessoa em particular. Será então tempo de paz, de alegria e de feli­cidade que há-de durar. Maria será levada em triunfo e dará a voltas ao mundo!» (Segundo os documentos autenticados pela Autoridade competente).

[2] Campana, obr. cit. tom, II, págs. 611-612.

[3] Lc. I, 32.

[4] Mt. XXVIII, 18.

[5] De Mysteriis Vitae Christi, D. XXII s. 2, § Tertia ratio.

[6] Terrien, obr. cit. II p. tom. II, pág. 217.

[7] Brev. Rom. 3.ª ant. final B.M.V. «Gloriosa Regina nundi», «Regina mundi digníssima» (in Com. B. M.V. de Monte Carmelo).

[8] Sermo XXXV, De Sanctis.

[9] T. I., Sermão LXI, art. III, c. XXXVI.

[10] Um decreto da Dieta de 1655, no reinado de José Casimiro, proclamou a Santíssima. Nas ladainhas dizem os Católicos desta Nação: «Rainha do Céu e da Polónia rogai por nós».

[11] Regnum Galliae, Regnum Mariae é o título confirmado por decreto solene de Luís XIII, na primeira metade do século XVII.

[12] Honra-se o México com o título de Nação de Maria.

[13] Lancemos um olhar ao mapa da América do Sul — escreve Terrien — (obr. cit. II p. tom. II, pág. 381) e parece-nos ver um Livro de Horas da Virgem. Por toda a parte se encontram Conceições, Natividades, Assunções, Dores, Loretos e outras designações semelhantes.